Geografia em redes e a DIT

Geografia em redes e a DIT

Prof. William Poiato


A geografia em redes parte da ideia de uma ligação inerente entre todos os seres humanos e os recursos naturais do planeta Terra, e ela se sucede no capitalismo,ou seja, existe uma 'linha invisível' entre os seres humanos e suas atitudes em todo o globo terrestre e sua destruição do meio-ambiente.

Esta ideia, inspirada pela tecnologia da informação, demonstra uma ligação ecológica entre os hábitos de consumo e todo e meio-ambiente planetário, pensando na feitura mundial da mercadoria. Por ex: um tênis comprado no shopping Tatuapé, teve o tecido formado a Bolívia, com algodão indiano, cadarços trazidos da Tailândia e borracha processada na China, também responsável por toda a primeira costura, enviado para os Estados Unidos onde ganham as etiquetas e no Brasil é vendido para alguém, que após algum tempo o consumidor joga este tênis fora em alguma rua da zona leste paulista, a chuva escoa este tênis para o rio Tietê o mesmo segue até o Atlântico sul, onde auxilia à poluição e a degradação ecológica. Imagine todas as pessoas envolvidas neste processo, o número de indústrias e a retirada de recursos da natureza.


Rede de internet sob o Oceano pelo Mundo



Mapa logístico brasileiro


Por sua vez o capitalismo é o modo de produção no qual vivemos, ou seja, nossa organização econômico/política, ele se baseia em um sistema de auto reprodução de capital que pode ser resumido em cinco estágios para a multiplicação do capital, esta organização sistêmica é a seguinte:

1°Capital- Deve existir capital previamente acumulado, em forma de moeda, bens, títulos,etc.

2°Investimento- Devem existir locais e atividades de trabalho que tragam perspectivas de lucro onde o capital será investido, o investimento recairá em ‘meios de produção’, que são todos os instrumentos necessários ao trabalho, desde o local adequado para a execução de determinada atividade, as ferramentas, a matéria prima, etc.

3° Produção (trabalho)- Neste momento os trabalhadores(assalariados e autônomos),colocam os ‘meios de produção em movimento’, produzem a mercadoria- sendo ela uma mercadoria física ou um serviço-, segundo Karl Marx, é neste momento que se cria o valor da mercadoria, em sua própria existência.

4° Distribuição/venda – Neste momento a mercadoria se desprende do produtor e usa a infraestrutura estabelecida para se espalhar pelo mundo – este passo é importante para o espraiamento do alcance da rede- dependendo das condições e modos como este transporte ocorre adicionasse mais ou menos quantidade de valor na mercadoria. Após o transporte a mercadoria é retirada pelo consumidor.

5° Lucro- O último ponto do sistema, onde após ‘o tempo de giro socialmente necessário’ o valor da mercadoria vai ao investidor com “quantidade de valor investido +’mais-valia ’”. Lembrando que mais valia é o valor de trabalho não pago ao trabalhador e acumulado pela classe que possui os meios de produção. Após a acumulação deste valor um pedaço se transforma em capital, para reinvestimento e reinício do giro do sistema que visa como objetivo a acumulação crescente da classe que possui os meios de produção.

Percebam que cada momento do sistema tem uma série de situações necessárias e ideais, quando elas não existem o capitalismo enquanto sistema começa a entrar em crise, não à toa as crises neste sistema instável são uma constante.




Para a manutenção do capitalismo devem existir três situações:

Propriedade privada dos objetos- inclusive dos meios de produção- ou seja, as os objetos têm donos.

As pessoas são livres, a liberdade aqui não é tomada como a capacidade de se auto determinar, mas, sim, pela nítida separação do trabalhador dos meios de produção- pela exclusão da escravidão-, o que lhes permite ‘escolher’ onde irão trabalhar – dentro das ofertas de trabalho estabelecidas.

A sociedade e a geografia da sociedade se organizaram para permitir a obtenção do lucro, ou seja, a sociedade irá se organizar para que cada uma das cinco etapas do capital sejam bem sucedidas.

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Tais relações não acontecem em um espaço flutuante ou imaginário, elas acontecem no espaço-geográfico e causam suas transformações no meio-ambiente e criam entre elas uma relação em cadeia, uma cadeia geográfica da mercadoria, vinculada ao sistema de rotação e acumulação de capitais, pensada em cinco pontos:

Exploração da matéria prima: Neste ponto o capital investido em meios de produção busca como mercadoria a exploração direta da natureza, utilizando seu material bruto como mercadoria- para ser transformada mais adiante -tal processo ocorre nos 'interiores' em locais relativamente distantes dos meios urbanos onde existam meios naturais disponíveis para a exploração.



Município de Araxá (MG)
Campo de mineração de nióbio para a feitura de eletrônicos na China 

Indústria de base: Após o material bruto ser transportado ele é colocado em movimento em uma indústria de base, ou indústria pesada, onde o trabalho transforma este material bruto em matéria prima processada para as demais indústrias, ou seja, é a indústria que alimenta as demais; mantendo a economia em movimento, tal processo ocorre atualmente nas cidades ditas médias – de 100 à 500 mil habitantes, em geral participantes de alguma metrópole. 



siderurgia de Mogi das cruzes(SP)


Indústria de transformação: Após a matéria prima ser processadas as indústrias de transformação utilizam diversas delas, e com o trabalho às transformam em mercadorias finais ou intermediárias para que outra indústria de transformação as transforme em produto final, é neste ponto do processo onde ela se torna uma mercadoria ‘popular’, não- especifica. Atualmente as indústrias de transformação também vem se concentrando nas cidades médias, no estado de São Paulo os três locais com maior distribuição então em "São José do Rio Preto (22,6% dos estabelecimentos de grande porte); Bauru (19,4%), e Presidente Prudente (16,1%)" segundo a FIESP [dados 2018]



Indústria de calçados Jaú(SP)

Distribuição – Neste ponto o Estado-nacional toma papel preponderante, a construção de infraestruturas para a circulação de mercadorias garantindo a existência de infraestruturas e modelos intermodais de transporte sempre ‘atualizados’ para aumentar a velocidade e diminuir o custo neste ponto- no Brasil nós temos como carro chefe o transporte rodoviário e para exportação os portos tomam papel importante, além do transporte em trilhos.- Estes instrumentos para transporte são denominados" Próteses no Espaço".


Estrada de ferro EFVM (ES-MG)


Porto Mariel em Cuba 


Rodovia Bandeirantes (SP)



Venda- As mercadorias são comercializadas no mundo todo, porém os principais pontos de consumo são as megalópoles globais, grandes polos consumidores, que possuem os locais de consumo e também os capitalistas e as bolsas de valores para a captação do lucro.



Megalópole de São Paulo(São Paulo-Campinas-Santos)-Brasil

Megalópole Amsterdam(Amsterdam-Haia-Utrecht-Rotterdam)-Holanda



Símbolos de Wall Street- Centro financeiro de EUA


Logo,a cadeia geográfica da mercadoria se completa, pautado na exploração dos meios naturais, ao consumo nos grandes pólos populacionais de todo o planeta os ‘meios-de-produção’ e as mercadorias se interligam em todo o planeta, causando a ligação intrínseca entre todos os seres humanos e os recursos naturais, nosso modo de produção e reprodução de vida forma uma determinada organização para o giro e multiplicação do capital.


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Para os ecologistas falta neste ciclo uma análise crucial para entendermos como o capitalismo lida com o meio ambiente mundial, iremos avaliar o argumento ecologista á seguir:


  • Seu ciclo se inicia na tomada/exploração da 1° natureza (ou seja, da natureza não transformada pelo ser humano)- a exploração da matéria prima que como vimos que ocorre distante dos grandes centros)


  • Segue com a transformação e uso em 2° natureza (Ou seja, a natureza transformada pelo ser humano). As fases industriais, de distribuição e de venda que como vimos ocorrem nas cidades médias e grandes e nas megalópoles respectivamente.


  •  O último ponto, desprezado pelo ciclo geográfico capitalista da mercadoria é o descarte, este ocorre de duas formas. Nas ‘lixeiras’ onde serão transportados para lixões à céu aberto, aterros sanitários, incineradores e a parte ‘luxuosa do lixo’ à reciclagem, ou o descarte no solo onde seu destino é ou a contaminação do solo- sendo soterrado- também existe o risco de a partir das chuvas e do ciclo da água ocorra uma contaminação dos rios até que o lixo se transporte ao oceano contaminando-o também.

Para os ecologistas o ponto de ‘exploração da 1° natureza’ aparece enquanto ato predatório, pois, o ser humano toma para a si bens da natureza desequilibrando sistemas, destruindo habitats e espécies endêmicas,etc; sem limite aparente.

O ponto descarte também é ignorado pelo sistema atual o que vem entulhando lixo em determinados pontos do globo- já irrecuperáveis para agricultura ou moradia- ou então contaminando solos e oceanos com lixo urbano-agrário-industrial.


Este é um quadro geral de como sistema capitalista atua no espaço-geográfico, desenhando-o em redes de mercadorias das mais diversas, porém assim como regiões se especializam em partes da produção, países inteiros se especializam a nível internacional com funções específicas entre eles, esta especialização entre exploração da matéria bruta, indústria de base, indústria de transformação, distribuição e consumo, somando a esta função os locais especializados em capitalização (centros financeiros). Isto é a DIT (divisão internacional do trabalho),onde cada país e responsável por uma parte da produção internacional para que o sistema funcione, sem que esta divisão seja planejada ou igualitária. 

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Na globalização a partir dos anos 80’-90’ acontece um movimento de migração das indústria de base e de transformação de determinados setores dos grandes países desenvolvidos para países em desenvolvimento – reproduzindo em larga escala o que houve entre as metrópoles e as cidades média- mesmo assim estes países mantiveram com posições específicas na DIT que se diferencia hoje pelo nível de tecnologia empregada e desenvolvida nos países e nas pressões para seu desenvolvimento ou atrofiamento.

Segue então uma especialização a nível internacional, onde na nova (des)ordem mundial os países do norte mantém a sua preponderância financeira, atrelando os países do sul como subordinados à sua tecnologia e poderio de investimentos.

Dentro do sistema descrito uma divisão internacional do fluxo de mercadorias possível é esta: 







Demonstrando que na atual DIT, mesmo com uma industrialização incipiente nos países do sul causada pela globalização e a criação das imensas redes-geográficas- econômicas, os centros de capitais -ou seja, o local onde o lucro se concentra para reinvestimento no globo- se mantém no Norte tendo como protagonistas os EUA e a 'ZONA do EURO', claro que este sistema não é imóvel,vemos na ásia surgindo novas opções, os países em desenvolvimento - os BRIC'S- vem contestando esta estrutura e a crise de 2008 que abalou os EUA ea EUROPA tem aberto flancos para uma reorganização da DIT.

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