Nas margens da Belle Époque amazônica: patrimônio e relações de poder nos Marajós | Araújo, Lucas Monteiro & Pacheco, Agenor Sarraf

Resenha: Nas margens da Belle Époque amazônica: patrimônio e relações de poder nos Marajós | Araújo, Lucas Monteiro & Pacheco, Agenor Sarraf

O presente texto é uma resenha do artigo "Nas margens da Belle Époque amazônica: patrimônio e relações de poder nos Marajós" por Lucas Monteiro Araújo e Agenor Sarraf Pacheco. Lucas Araujo doutorando em Antropologia - área de concentração: Antropologia Social (PPGA/UFPa). Possui Mestrado em Antropologia - área de concentração: Antropologia Social (PPGA/UFPa). Graduado em Museologia (ICA/UFPa). Por sua vez, Agenor Pacheco é doutor em História Social (PUC-SP, 2009); Mestre em História Social (PUC-SP, 2004); Especialista em Métodos e Técnica em Elaboração de Projetos Sociais (PUC-MG, 2002) e Licenciado Pleno e Bacharel em História (UFPA, 1999).

Os autores iniciam colocando "o Tema em tela" o texto nos lembrando que a Belle Epoque Amazônica foi a período áureo do desenvolvimento estrutural e de modernização das regiões produtoras de borracha, sob a dialética da modernidade: A expansão da riqueza, das estruturas físicas (como trilhos) e da urbanização associada a mudança de hábitos públicos e privados e um certo ar de democracia para a elite. Isso nos anos 40' do século XIX, onde as drogas do serão perdem espaço para exploração da borracha, tal período que se inicia com a demanda de borracha para objetos simples como sapatos e termina com a ampliação de consumo industrial, como pneus segue entre 1840-1870- o navio a vapor foi a ferramenta que interligou Belém e os seringais com Europa e EUA, criando o auge entre 1880-1910. Rapidamente Belém e Manaus abrigavam uma nova burguesia, que importavam para estes grandes centros a arquitetura, cultura, moda europeia, especialmente francesa (Manaus era conhecida como Paris dos trópicos), a antiga elite (militares e escravista) deram lugar a nova burguesia (extrativismo gomífero, seringalistas, comerciantes e financistas) que forçaram esta modernização- enquanto grupos locais, trabalhadores e desfavorecidos tentavam influir à sua maneira no processo. Os autores irá avaliar o patrimônio marajoara deste período, para tal salienta que:
a) Patrimônios históricos só começam a ser preservados pós revolução francesa (1789)
b) Os monumentos guardam um espirito nacional e diversas questões de seu tempo
c) Possuí valor turístico/econômico ao ser tornado ponto de visitação


No Brasil estas ideias só ganham força na Semana de Arte Moderna de 1922, na busca de um a identidade  brasileira, Mario de Andrade se destaca neste processo, propondo em 1936 a uma lei de proteção de patrimônio histórico-cultural, complementando a constituição de 34',  passando por um longo caminho até chegar no patrimônio cultural, noção atual.
  


Os autores salientam os 'Caminhos da investigação', lembrando o debate que levantamos em 'O trabalho do historiador: Uma observação' sobre o problemas das fontes, ele possui uma fonte direta o jornal Liberal do Pará, porém as opiniões e dados do jornal não podem ser tomado por verdade apenas como apontamentos da realidade, além disso tentaram entender como a sociedade reagia as notícias do periódico, como isso se inseria no contexto histórico e quais intensões do jornal, além disso apelou-se para fontes oficiais, como relatórios, livro de registro de obras públicas e enciclopédias de municípios.

Enfim chegamos ao cerne do texto, 'Nas pistas dos Patrimônios Marajoaras', primeiro ele diferencia o Marajó dos Campos e o Marajó das Florestas pelas suas características físicas, em seguida demonstra que desde a década de 50' já se debatia a diferença de patrimônio cultural e natural. Sendo o primeiro 'riqueza natural', passível de exploração, e o segundo 'riqueza cultural' analisada pelo seu 'avanço'. Somasse a isso o aspecto histórico, Marajó foi colonizado por grupos Jesuítas e católicos em geral a visão de patrimônio religioso e cultural, o poder sempre esteve ligada à estas instituições, misturando-se assim o patrimônio público entre igrejas, escolas, hospitais, cadeias, etc. 

homem extraindo leite de mangabeira em Marajó 

Durante a Belle Epoque e até 1950 a principal atividade de diversos municípios de Marajó era a extração de látex, criou-se a contradição social entre riqueza-miséria na região. Antes da extração de borracha a divisão geográfica de Marajó fundava uma divisão econômica, em Marajó dos Campos, a criação de gado era a principal atividade, na floresta a extração era generalizada, porém o cacau se destacava. Em 1840 o látex se destaca, entre 1840 e 1880 o número de cabeças de gado diminui de 500 mil para 300 mil, seguida pela exploração da floresta. Além disso, os seringueiros, no inverso que impossibilitava a exploração, retiravam e vendiam madeira e pescavam (mesmo em época de desova) atividades pouco sustentáveis aos olhos atuais.Socialmente falando ela modificou costumes, introduziu novos padrões de relação com a natureza e revelou novas formas de poder. Sobre tal questão as pesquisas mostram que a introdução do látex fez com que fosse gerada uma “febre pelo ouro negro”, atraindo pessoas das mais diversas regiões para as cidades e matas. 


Em 1870 a questão urbana começa a se evidenciar na região, as cidades começam a ser obrigadas a desenvolver estruturas, cadeias não poderiam mais "se assemelhar a um curral de cabras do que a uma casa de guardar presos!”, o poder público era gerido por interesses privados, o que causava parte do problema, porém as instituições religiosas também tinham uma relação patrimonial enviesada, hora pelos desejos individuais, hora pelas necessidades e ideologias ao mesmo tempo cativando a população. Também e caráter da cidade superpopulosa, com pouca estrutura as febres e epidemias- desta forma as cidades inchavam e desapareciam em períodos extremamente curto de tempo (a exemplo de Gurupá). 

De certa forma, contra o censo comum desenvolvimentista acerca do período, que teria erigido um patrimônio em toda parte que látex se consolidou, a região marajoara demonstra que a grande acumulação de capitais via exploração da borracha pode, por características diversas, deixar um patrimônio minimo, inclusive abandonado para sociedade (enquanto a nova burguesia passa a existir e reproduzir capital).

Os autores concluem:


"A problemática, iniciada com a extração da borracha, tornou as cidades marajoaras centros periféricos de exploração, onde seu desenvolvimento teve grande regresso devido a polarização dos investimentos nas grandes capitais. Para muitos, a Belle Époque propiciou um grande avanço estrutural e cultural para a região amazônica[...] De fato ainda glorificam-se as grandes mudanças propiciadas por tal período, contudo, precisa-se mudar o foco dos estudos, atentando para as diversas realidades que envolvem um mesmo evento."

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